Ele é jovem e apaixonou-se por uma mulher mais velha. Dizia ser o seu primeiro grande amor. Os seus olhos brilhavam quando falava desta mulher, com a qual sonhava até acordado. Numa noite, durante um jantar foi surpreendido pelos seus pais ao tomar conhecimento de que ele próprio iria casar-se com uma jovem, por sinal sua amiga de longa data. Era um casamento arranjado. O jovem aflito, resolveu ter uma conversa com a sua mãe, dizendo que não queria casar porque amava outra mulher. A resposta que obteve de sua mãe foi: “Ela não é da nossa religião (muçulmana). Vais matar o teu pai do coração.” O jovem bem que tentou argumentar de tão desesperado que estava. Entretanto, a sua mãe cai no sofá, dizendo estar a sentir-se mal e que a sua tensão arterial estava a alterar-se. Por medo e com o peso da culpa se algo acontecesse a seus pais, o jovem aceitou casar-se e hoje vive profundamente infeliz.
Este é um caso real que pude acompanhar e que constitui um bom exemplo de como os pais podem interferir negativamente no bem-estar dos seus filhos, tornando-se emocionalmente tóxicos para estes. Situações como estas repetem-se diariamente na nossa sociedade e um pouco por todo o mundo.
O termo “pais tóxicos” é usado para descrever aqueles pais e mães que, ainda que inconscientemente, se sentem no direito de controlar a vida dos seus filhos, seus interesses, sonhos e escolhas, projectando neles os seus próprios problemas, frustrações, inseguranças e medos.
Então, como reconhecer se tens ou não pais tóxicos? Ou ainda se podes ser um pai ou mãe tóxico/a. Há algumas características típicas que nos ajudam a identificar.
- Pais tóxicos são controladores e super-protectores. Estão constantemente a vigiá-los, procurando saber o que estão a fazer, com quem estão, para onde vão, etc. Tentam manter a criança ou jovem perto de si, da sua vista, o tempo todo. Muitas vezes, por medos e inseguranças suas, impedem os filhos de sair para brincar ou passear, de ir a convívios com amigos ou realizar actividades de lazer do seu interesse. Prendem os seus filhos em casa como forma de protegê-los.
- São autoritários e querem interferir nas escolhas/decisões dos seus filhos. Desde a roupa a usar, à forma de apresentar o cabelo, o curso a seguir, aos amigos e parceiros a ter ou à carreira profissional a seguir. São muitos os exemplos a partilhar. Eles não se preocupam em saber se é de interesse ou desejo dos filhos. O que interessa é o que eles acham que é o melhor para os seus filhos. Os filhos têm o direito de sentir e escolher o que é melhor para si mesmos. A propósito lembro-me há um tempo atrás de receber uma mãe que inscreveu a sua filha no Ballet e estava desgostosa porque a filha não gostava das aulas. Ela queria ir para a natação. Foram suficientes 5 minutos de conversa para perceber que aquela mãe tinha o sonho de ser bailarina quando criança e foi impedida pela sua mãe. Agora, já adulta carrega essa frustração e projecta-a na sua filha. Ou seja, quer viver o seu sonho, através da filha.
- Usam da manipulação emocional ao relacionar-se com os filhos. São pais que levam os filhos a sentirem-se culpados ao não procederem como eles bem acham. Para isso, servem-se de várias tácticas manipulatórias para atingir os seus objectivos, como por exemplo: usam da chantagem, da mentira, da intimidação, ameaça, medo e do distanciamento. O caso narrado no início deste artigo é disto exemplo – um verdadeiro enrredo de manipulação emocional. Há pais que chegam a colocar os seus filhos contra outros membros da família, por exemplo, em caso de separações, usando-os como bodes expiatórios.
- Praticam agressão verbal e usam a crítica destrutiva. Geralmente elevam o tom e mudam o timbre de voz ao falar com os filhos. Passam a vida a criticar e a apontar os erros de seus filhos. Chegam até a desconsiderá-los, utilizando termos pejorativos, inclusive na presença de terceiros. Muitos têm o hábito de dizer aos seus filhos que não tem valor, que são um fracasso, e isto e mais aquilo. São pais altamente julgadores. Rotulam e classificam seus filhos, de acordo com a sua leitura do mundo e passam a vida a comparar seus filhos com terceiros. Estes pais raramente elogiam os seus filhos.
- Manifestam ser vítimas dos seus filhos. Pais tóxicos chegam a queixar-se para terceiros sobre como seus filhos são desobedientes, rebeldes, maldosos e como os maltratam (a si pais). São pais que justificam as suas acções, devido ao comportamento “insuportável” de seus filhos.
- São exigentes e ditadores. Pedem aos seus filhos mais do que a criança/jovem pode ou consegue dar, procurando satisfazer as suas expectativas. São ditadores, achando-se “donos” dos seus filhos e que tem o poder de mandar neles. Estão constantemente a interromper a criança/jovem a brincar, jogar ou a fazer as actividades que escolheu e mandá-la fazer ou buscar isto e aquilo para sua própria conveniência. Não consideram sequer se seus filhos têm ou não vontade de o fazer.
- São violentos fisicamente. Muitos pais tóxicos servem-se de castigos severos e cruéis e do acto de bater para educar seus filhos. Servem-se da agressão física para poder moldar/mudar determinado comportamento na criança/jovem que interpretam como inapropriado.
- Tem sérias dificuldades em ouvir e respeitar a opinião dos filhos. Pais tóxicos não são suficientemente humildes para escutar, com o coração, as necessidades e opiniões de seus filhos. Muito provavelmente porque assim aprenderam na sua infância com seus pais. E também porque são arrogantes ao ponto de acharem que as crianças/jovens não sabem o que dizem e o que querem ou merecem. Constantemente ignoram seus filhos quando estes estão a falar/expressar, interrompem ou mandam-lhes calar. Parece evidente que estes pais tornam-se no principal pesadelo dos seus filhos.
As consequências de toda esta gama de padrões comportamentais e de toda a vibração energética associada são profundamente negativas para estas crianças, jovens e futuros adultos.
Absolutamente nada justifica pais adoptarem estes comportamentos, particularmente, a agressão verbal e física. Só adultos desequilibrados emocional, mental e espiritualmente é que servem-se dos filhos e da agressão verbal e física, ainda que inconscientemente, como bodes expiatórios, para deslocar a sua raiva ou projectar suas frustrações (com o seu relacionamento, com sua vida, seu trabalho, enfim, suas escolhas). As crianças/jovens filhos passam então a ser “autênticos caixotes de lixo dos adultos”.
Esta é a razão por que, quando muitos pais me procuram para marcar uma sessão comigo e seus filhos que estão com problemas de comportamento, sugiro que quem venha à sessão seja a figura parental (pai ou mãe). Quando o pai/mãe está emocionalmente equilibrado, automaticamente, passa essa energia boa para seus filhos. È também fundamental passar aos pais estratégias parentais adequadas e saudáveis para lidar com estas crianças/jovens de hoje que são muito avançadas em termos conscienciais e revelam tamanha sabedoria. Verdadeiros Mestres para os Adultos.
Crianças educadas por pais tóxicos desenvolvem baixa auto-estima, sentem-se frustradas, confusas, inseguras e tem muitos medos e bloqueios, com evidentes problemas comportamentais. Quando adultas tornam-se pessoas sem Amor Próprio, submissas, co-dependentes, complexadas, com sentimentos de inferioridade, auto-imagem e auto-conceito negativos, inseguras, com muitos medos, incapazes de se comprometer, com sentimentos de culpa, vergonha e vários problemas emocionais. Ou, pelo contrário, quando adultas podem tornar-se rebeldes com tendência a repetir o padrão que vivenciaram na sua infância.
Muitas crianças que tiveram pais tóxicos quando adolescentes e já adultos chegam a apagar da sua memória alguns anos da sua infância. Aqueles em que ocorreram os acontecimentos mais marcantes e dolorosos do ponto de vista emocional. Na realidade a informação está lá no subconsciente. Só precisará de ajuda para trazê-la para o consciente.
Se desconfias que tens pais tóxicos ou que enquanto pai ou mãe podes estar neste momento a prejudicar o/a teu/tua filho/a, podes quebrar este ciclo de imediato. A mudança vem de dentro e só tu tens o poder de abrir essa porta. Partilha aqui a tua experiência, enquanto filho/a ou pai/mãe. Deixa as tuas dúvidas. Podemos aprender muito uns com os outros e ajudarmo-nos mutuamente.
Originalmente escrito a 12.02.2017
Texto e Fotografia: Andrea Serra
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